Além de deixar patente a insegurança em que vivem os cidadãos ordeiros em território brasileiro, a ofensiva cruenta lançada pelo Primeiro Comando da Capital (PCC) em São Paulo acabou por revelar as fraquezas de caráter da elite civil dirigente da democracia e de parte relevante da sociedade civil nacionais.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o PT se aproveitaram de forma tão oportunista do natural impacto provocado pelo banho de sangue na imagem de seu principal oponente na eleição presidencial de outubro, o ex-governador paulista Geraldo Alckmin, do PSDB, que tornam menos absurda do que parece a possibilidade até de ter havido uma espécie de acordo tácito de troca de gentilezas entre meliantes e postulantes. Só faltava agora alguém descobrir que o comissário Zé Dirceu andou visitando Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, líder da blitz contra agentes da lei e cidadãos inocentes, em sua cela de segurança máxima, em Presidente Bernardes, desempenhando missão idêntica à da visita ao ex-presidente Itamar Franco, em Juiz de Fora.
Mas os tucanos não ficaram atrás neste capítulo. Direto de Nova York, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, baseado em conjecturas sem apoio em fatos, condenou o eventual acordo da lei com o crime para que as hostilidades cessassem. Percorrendo o Brasil com sua Armata Brancaleone, o candidato Alckmin também distribuiu picadas venenosas contra seu sucessor, Cláudio Lembo, do PFL. Por mais críticas que possam ser feitas à postura do governador, estas nunca poderão omitir o fato incontestável de que ele é herdeiro de um desastre tucano.
Como se sabe, tucanos são avessos à repressão, chegando a ter nojo de polícia, e seu movimento pendular de morde-e-assopra entre os direitos humanos dos bandidos e a paz dos cidadãos imobiliza-os como chefes de polícia. Isso fez com que as gestões de Mário Covas e Geraldo Alckmin (como antes já havia sido a de Franco Montoro), avaliadas positivamente pela população em vários setores, fossem sempre um desastre em segurança pública. Talvez por saber disso, o candidato do PSDB ao governo de São Paulo, José Serra, se omitiu.
A falta de apoio e até o fogo amigo dos tucanos contra seu aliado são uma manifestação de estranho oportunismo. E inusitado, aliás. Normalmente, o oportunista se beneficia, de alguma forma, de seu ato. No caso específico, a postura tucana é também estúpida do ponto de vista eleitoral, podendo até ser definida como suicida, como comprova a constatação do Datafolha de que o presidente petista se reelegeria hoje no primeiro turno se o PMDB não apresentasse candidato, o que é muito provável.
Não será justo atacar o caráter dos políticos brasileiros sem mencionar a absurda decisão da CPI da Venda de Armas de tomar depoimento do citado Marcola no Fórum da Barra Funda em São Paulo. Exaustivamente interrogado por quem sabe, o chefão do PCC nada tem a revelar de útil a parlamentares que nada têm a questionar. Trata-se apenas de mais um show de exibicionismo pré-eleitoral, dando ocasião para o bandido fugir a caminho do depoimento ou, se preferir, dar ordens pela televisão, ao vivo, a suas hordas.
Capítulo à parte na burrice vigente é a sibilina transformação dos assassinos covardes do PCC em heróis e dos heróicos policiais por eles vitimados em vilões, pela imprensa e pela mídia eletrônica. Prova cabal disso é a capa da revista semanal Veja na semana posterior à batalha campal de São Paulo, com a efígie do canalha-mor, promovido à condição de santo dos oprimidos por um bando de advogados formados pelo dinheiro sujo do tráfico de drogas e de jornalistas deslumbrados com sua retórica trôpega e torpe.
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