A conta do celular da filha de Tião Viana e o frete de jatinhos por Tasso Jereissati não justificam o fechamento do Congresso, mas denunciam a falta de vergonha dos senadores
Imagine, preclaro leitor, abrir o envelope da conta do telefone celular de algum dependente seu, antes de ingerir o café da manhã, e descobrir que este ente querido cometeu a insânia de gastar R$ 14.758,07 em 20 dias do uso do aparelho. Será que o susto não entalaria o pedaço de pão em sua glote? Pois saiba que isso aconteceu exatamente quando você passou os olhos nos jornais da manhã de ontem. Afinal, quem você acha que pagou a conta do celular entregue ao senador Tião Viana (PT-AC) por seus pares e por ele generosamente cedido à filha em recente viagem de férias ao México?
Este dinheiro saiu direto de seu bolso para o buraco negro dos gastos e desmandos do Poder Legislativo, que, reza a teoria, o representa nesta democrática, mas desavergonhada, República. Desavergonhada, sim, porque não têm vergonha seus mandatários. Caso deste, tido e havido como concorrente probo do viciado José Sarney à presidência do Senado e que não teve pudor em justificar seu erro pela primariedade e pelo instinto paternal. Quem dará crédito à sua palavra, após ficar sabendo dos denodados esforços por ele empreendidos para esconder o malfeito? E este seria dele, dos pares, da filha, da torcida do Íbis ou do Acre que o elegeu?
E para que os idiotas da objetividade não me venham cobrar a insistência em bater no governo e deixar a oposição em paz, urge perguntar também quem vai perdoar o ex-governador do Ceará e ex-presidente nacional do PSDB, maior partido da oposição, Tasso Jereissati, pela arrogância desmedida na resposta que deu ao questionamento do uso de parte de sua verba para comprar passagens de avião para pagar o frete de jatinhos particulares em seus deslocamentos de Fortaleza para Brasília e no sentido oposto. Afinal, ele é podre de rico e não precisa pedir esmolas ao contribuinte para se dar ao luxo de viajar sem os incômodos exigidos de meros passageiros dos aviões de carreira. É, além disso, um líder partidário, do qual se exige o mínimo de austeridade, parcimônia e sensatez.
Alguns dirão que os deslizes de Tião e Tasso pouco representam, se comparados com as 181 diretorias do Senado ou os gastos dos nobres parlamentares com comunicações, moradia e outras despesas. Outros lamentarão que um colega dos dois, Cristovam Buarque (PDT-DF), não tenha tido a coragem de manter a proposta de fazer um plebiscito para manter, ou não, o Congresso funcionando.
Nada disso: os erros de Tião e Tasso são capitais e a piada de Cristovam é infeliz. Ruim com o Congresso, muito pior sem ele, diria o dr. Ulysses Guimarães nos tempos da ditadura. Mas um pouquinho de vergonha nenhum mal faria à cara destes insignes varões.
© Jornal da Tarde, publicado no Jornal da Tarde, quinta-feira, 9 de abril de 2009, p. 2A