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O poema da volta
Voltar é uma forma de renascer. Ninguém se perde na volta. (José Américo de Almeida, Antes que me esqueça, A Bagaceira)
No caminho da volta,
o amado pródigo
não se perde: renasce.
As flores da estrada
ganham viço
e uma fragrância nova,
um cheiro macio de perdão,
que se torna espera,
e de espera,
que vira celebração,
um perfume antigo
e fresco,
que lembra limão.Em Ítaca, Penélope cose
toalhas para o banquete,
fronhas para o bom sono
e os lençóis da conciliação.
Não há ressentimentos
nem orgulho vão
na fidelidade discreta
desse gesto familiar.
Um xale lhe cobre os ombros
e os dedos macios
puxam a corda da lira
fazendo-a vibrar
em canções de amor
e gestas de esperança,
de paciência nada vã.Volta bem
quem viajou leve:
cabelos à brisa do mar
e as mãos na cintura,
com braços por enlaçar
algum torso feito tronco,
um barco a navegar,
um berço de ninar,
um bote pra salvar.Volta ainda melhor
quem sempre o faz
por um bule de café,
um parco naco de pão
e uma sutil ilusão
de quem só navega
para o eterno retorno,
sempre em busca
da paixão imóvel,
que não muda nem cala,
despedaçado o coração,
só pra depois o colar
caco a caco,
taco a taco,
toco a toco.Assim são
os caminhos da volta:
sem medo e sem peso,
sem mágoa e sem rota.
Pois na volta
ninguém se perde.
Na volta
ninguém só pede.
E na volta
só se abre mão
da solidão.JOSÉ NÊUMANNE PINTO