O frouxo, o mimado e os chorões

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Blog do Nêumanne – Diário do Nêumanne

Sexta-feira 29 de abril de 2016

O frouxo, o mimado e os chorões

Aprendi desde cedo, ainda na minha infância no sertão do rio do Peixe, nos anos 50, a ser do contra, defeito que seria combatido por sal de frutas Eno, receitava um anúncio de sucesso, publicado nas revistas que meu pai trazia do Rio de Janeiro e de São Paulo em suas viagens de caminhão. Hoje cedo, em minha participação de uma hora na Rádio Estadão (FM 92,9), exercitei esse talento para o contraditório com muita insistência, repetindo o que tenho dito e escrito em encontros sociais, palestras e mensagens no computador. Refiro-me à crítica generalizada que tenho ouvido de amigos e plateias e lido no Tweeter (@jose_neumanne) e em e-mails sobre a atuação decepcionante dos deputados federais que autorizaram, por 367 a 146, o Senado a abrir processo de impeachment contra Dilma Rousseff. Para isso, não me faltam argumentos fortes, todos solidamente apoiados na vida real. Apesar de a representatividade da Casa ser discutível, no domingo 17 os representantes do povo realmente votaram de acordo com a vontade da maioria, e com alguma folga. Agora, aliás, no Senado, a preferência popular pelo impeachment, atestada em pesquisas, como a do Datafolha, coincide com a manifestação da preferência de votos, 61% dos 81 senadores – 50 contra 31. Os discursos são muito similarees aos que me acostumei a ouvir no tempo em que trabalhei no Senado e, mesmo antes, no impeachment de Collor, em 1992, por exemplo. Circulam na internet dois exemplos disso: um vídeo da Escolinha do Professor Raimundo em que Chico Anysio ironiza os votos sim dedicados a Deus e à família e o discurso do senador Magno Malta na sessão de ontem da comissão do impeachment. O parlamentar empregou expediente já usado na Câmara, ao citar, ipsis litteris, o voto de Jaques Wagner, ministro da secretaria pessoal da “presidenta”, naquela sessão. Cito-o: “Quero dedicar estas palavras e o meu sim na tarde de hoje a meus pais e meus filhos. Esta Casa não lhes negará a esperança de que amanhã o Brasil será outro”. Terminada a leitura, Malta completou magistralmente: “Quando é contra eles não vale, porque eles acham uma vergonha”. Este é o lema do comportamento dúbio em que o PT tem sido pródigo na defesa da manutenção de sua gestão propícia à roubalheira e o foi ontem na, esta sim, vergonhosa sessão da comissão de impeachment do Senado. O comportamento da bancada que só esperneia e chora, instalada na primeira fila do auditório, foi execrável e, felizmente, inócuo. Lindbergh Farias exacerbou de sua condição de coronelzinho mimado da truculenta elite rural de meu Estado natal, a Paraíba. Quando era presidente da UNE, durante o governo Itamar Franco, no qual gozava de regalias e privilégios, o então ainda jovem agitador costumava invadir encontros privados do presidente para reclamar benesses com os mesmos altos brados que se acostumou a ouvir dos ancestrais na infância. Sempre era seguido pela aflita secretária, que tentava em vão explicar ao chefe que ele não se dignara esperar a audiência acabar, Lindbergh bradava aos quatro ventos: “Porra, Itamar, quando é que vai sair a grana pra reforma da sede da ONU na praia do Flamengo?”. Ontem também abriu sua boceta de Pandora de grosserias contra a convidada, Janaína Paschoal, respeitável professora de Direito da Faculdade da USP no Largo de São Francisco. Ao seu lado, outra petista, Fátima Bezerra, aconselhou a autora do pedido de impeachment a voltar para a classe. E Romário abusava da malandragem ao perguntar ao presidente da comissão a que horas ele falaria. Tudo isso foi facilitado pelo comportamento pusilânime do também meu conterrâneo Raimundo Lira. Nascido em Cajazeiras, muito perto de minha Uiraúna natal, ele não honrou a frase clássica de nosso colega no Estadão Euclydes da Cunha a respeito da sofrida população do Semiárido: “O sertanejo é antes de tudo um forte”. O senador é, antes de tudo, um frouxo. Mas isso não impediu que Janaína brilhasse. E como brilhou! Fugiu da constatação de acerto da máxima de Magno Malta respondendo às tentativas de desqualificar seu trabalho, atribuindo-lhe filiação ao PSDB ou cobrando dela até o fato de haver defendido um procurador que batera na mulher. Abusando do direito de espernear e chorar e do nhenhenhém protelatório do encarregado de pôr ordem na sessão, a turma que chora para continuar mamando, graças a Deus, não conseguiu calar Miguel Reale Junior, que nela cunhou a melhor sentença contra a farsa do “impeachment sem crime é golpe”. É esta: “Abaixo a ditadura da propina”. Bingo! A impávida Janaína respondeu à crítica de que incluíra a Lava Jato na denúncia que a Câmara expurgara lembrando que essa exclusão se deveu ao presidente da Casa ao lado, Eduardo Cunha, xingado pelo PT como corrupto, mas protegido quando tentou esconder a própria culpa na “república de Curitiba”. Cássio Cunha Lima, que encerrou a sessão já de madrugada, pontuou muito bem mais essa evidência de crimes seriais do desgoverno e seus poucos, mas ainda barulhentos, aliados. Na rádio lembrei a Emanuel Bomfim, que me acompanhava no estúdio, que a turminha do chora na teta é proporcional aos gatos pingados instruídos por Guilherme Boulos a queimar pneus velhos na rua e parar o trânsito de grandes cidades. Eles, felizmente, não puseram fogo no Brasil, conforme haviam anunciado. Contei também que, no dia da sessão, o procurador Deltan Dallagnol, da Operação Lava Jato, deu um banho de retórica didática mostrando como a maior empreiteira de obras do Brasil, a Odebrecht, montou um esquema empresarial para usar bilionárias sobras de superfaturamento para pagar propinas à organização criminosa que agora comete o mais hediondo dos crimes: usar como único argumento na defesa de continuar pilhando o erário o soberano e nobre voto popular. Outro destaque do mesmo dia foi o discurso sabujo do prêmio Nobel da Paz argentino Adolfo Pérez Esquivel no plenário do Senado a favor da tese absurda do golpe dado pelo Congresso, com autorização do Supremo, na indigesta crise patrocinada por nosso ainda insepulto governo zumbi. O militante da luta contra ditaduras militares latino-americanos tornou pública a própria falta de civilidade exibindo sua condição de fazer parte da patota do me dá a chupeta pro nenê não chorar, em consonância com Vanessa Graziottin, Gleisi Hofman e José Pimentel, cujas boas maneiras são proporcionais à capacidade de enxergar o óbvio. Para completar minha vontade de contrariar o caradurismo vigente na luta partidária, chamo a atenção do paciente leitor para o cinismo de Fernando Pimentel, amiguinho de Dilma há muito tempo, ao nomear madama Carolina secretária de Estado para livrá-la da agonia do assédio da polícia e da promotoria, órgãos do Estado interessados na participação dela em tenebrosas transações do marido e do amigo do peito Bené, já guardado numa cela. Carolina até pode ser bela como Marcela Temer, mas seu comportamento suspeito na megarroubalheira nacional torna impróprio o uso da definição de recatada. Do lar até pode ser! Mas, depois da Operação Acrônimo, o casal que ocupa esse lar não dá os melhores exemplos para as  crianças de Minas e do Brasil. Vade Retro!

Jornalista, poeta e escritor

(Publicado no Diário do Nêumanne, Blog do Nêumanne, Estadão, sexta-feira 29 de abril de 2016)

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