Diário do Nêumanne
Quarta-feira, 4 de maio de 2016
A eternidade em sete dias
Sei que não foi fácil ter que aguentar os três patetas defendendo Dilma e seus miquinhos amestrados com a piada cínica do “impeachment sem crime é golpe” na comissão específica do Senado. Mas o preclaro leitor destas malvadas linhas há de convir que os brasileiros de bem têm vivido dias de esperança ao perceber que, enfim, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, abriu sua fornida caixa de ferramentas, que os gregos chamariam de boceta de Pandora, para de lá tirar a lupa com a qual ele promete mandar sua turma investigar os crimes que de fato precisam ser punidos, caso o Extremo Protelador Geral queira realmente transformar-se no que sempre deveria ter sido, o Supremo Tribunal Federal.
Tem sido doloroso, mas, ao mesmo tempo, reconfortante:
1 – Perceber que a ainda não comprovada, mas verossímil, delação premiada de Delcídio do Amaral, que era líder do desgoverno Dilma no Senado, teve reconhecida sua condição de narrativa fiel da promiscuidade de Brasília. Nesta todos se misturam: governo e oposição, juízes e réus, ministros e advogados grã-finos, todos os partidos e todos os Poderes da República compartilham um churrasco sem fim, cuja carne na brasa tem sido a nossa. Ver as cabeças de Lula e Aécio nesse bandejão não tem preço.
2 – Saber que o Ministério Público Federal não demonstrou a gratidão com que o Jararaca Ratão contava, conforme disse ao serviçal Finório Jaquinho, também incluído no cardápio, para continuar prosperando a hipótese absurda de que a quadrilha que promoveu o maior saque ao Tesouro Nacional e ao patrimônio público em todos os tempos não tinha chefia. Ao contrário de qualquer outra organização criminosa em atividade no planeta. O reconhecimento de Janot de que nada do que aconteceu podia ter escapado à percepção e até ao comando dele é de cabo de esquadra, como se dizia nos tempos do coronel Alexandre Pinto, do Rio do Peixe, meu bisavô. Segundo o procurador-geral da República, em seu pedido ao STF para investigar o chefão, “essa organização criminosa jamais poderia ter funcionado por tantos anos e de uma forma tão ampla e agressiva no âmbito do governo federal sem que o ex-presidente Lula desse não participasse”. Bingo! O Conselheiro Acácio, personagem do gênio luso Eça de Queiroz, não teria resumido melhor em letra de forma aquilo que Nelson Rodrigues, suburbano carioca do Recife, chamou de “óbvio ululante”.
3 – É também justa e óbvia a constatação, da lavra do mesmo Janot, de que Dilma, Lula e José Eduardo Cardozo produziram a rainha de todas as provas, ao serem pilhados num grampo telefônico e nos atos coerentes com ele em flagrante de obstrução às escâncaras da Justiça, nomeando o ex para a Casa Civil para, dessa forma, escondê-lo na Esplanada, à sombra do foro privilegiado, do martelo de prata do juiz Sérgio Moro. O mito da pureza imaculada de madama, que nunca foi sólido como ela imagina, esboroa no ar ap impacto dessas marteladas. E tudo começou com uma prova de extrema de Sua Insolência: sua nota explicando a este Estadão velho de guerra que a culpa pela compra gravosa da “ruivinha de Pasadena” era do burocrata de sexta Cerveró. Além de astravancar o pogrécio, a estupidez também puxa o gatilho dos sincericidas.
4 – Os senadores que dizem não ao impeachment não são mais 20 no placar do Estadão, mas 20, um a menos. Vicentinho Alves (PR), do Tocantins de Kátia Abreu, virou indeciso depois de ter ouvido a arenga dos três patetas na comissão do Senado. Será que ele não gostou da insinuação da ministra da Agricultura de que todo brasileiro, e ele o é como eu e você, é caloteiro ou se perturbou com o lengalenga do trio Parada Dura na sessão de ontem?
É claro que ainda falta o STF provar que está no topo do Poder Judiciário para fazer justiça, e não para ser grato a prebendas. Ainda falta o Senado começar e terminar o processo de impeachment por crime de responsabilidade contra a mãe do escândalo, da crise e do desemprego, como magistralmente demonstrou o procurador do Tribunal de Contas da União (TCU), Júlio Marcelo de Oliveira. Tudo pode ter início a partir de quarta-feira que vem. Pode parecer uma eternidade, mas serão apenas sete dias.
(Publicado no Diário do Nêumanne no blog no Estadão)
http://politica.estadao.com.br/blogs/neumanne/a-eternidade-em-sete-dias/