Transcrição da matéria publicada na página da UniÍtalo – Centro Universitário Ítalo Brasileiro.
Palestra foi a atração desta terça-feira na Jornada, promovida pelo novo Núcleo de Ética e Cidadania do UniÍtalo
José Nêumanne Pinto foi a atração desta terça-feira (13) da I Jornada de Ética e Cidadania do UniÍtalo. O evento, que continuará durante toda a semana, é realizado pelo novo Núcleo de Ética e Cidadania do Centro Universitário Ítalo Brasileiro, idealizado e liderado pela Dra. Viviane Maldonado, Juíza de Direito da 1ª Vara Cível do Foro Regional de Santo Amaro.
Com o Teatro Ítalo Brasileiro novamente lotado, José Nêumanne Pinto conversou com os presentes sobre Ética e Jornalismo e abordou temas que tomam o noticiário nacional, demonstrando como a falta de ética vem transformando as relações humanas em um estado de barbárie. Com vasta experiência na imprensa, o jornalista atualmente é comentarista da rádio Jovem Pan e editorialista do jornal O Estado de S. Paulo, além de já contar com 11 livros publicados.
Terrorismo
José Nêumanne Pinto iniciou sua apresentação falando sobre a banalização da violência e lembrou de casos recentes no país, como a morte de um torcedor de futebol em Pernambuco, atingido na cabeça por um vaso sanitário arremessado por rivais.
Lembrou da atuação de Jean-Paul Sartre e Albert Camus na Guerra de Libertação da Argélia, nas décadas de 50 e 60, e de como o primeiro apoiou ataques terroristas, enquanto o segundo sempre se posicionou contra as ofensivas. “Não ao terror sempre. O terror é indiscriminado e, portanto, bárbaro”, citou.
Segundo Nêumanne, em uma coletânea de editoriais escritos por Camus, ainda sem tradução para o português, fica clara a ideia do primado da ética sobre o interesse, algo que parece totalmente invertido atualmente no Brasil. “Pensei em pedir para um amigo deputado mudar os dizeres da bandeira de ‘ordem e progresso’ para ‘me engana que eu gosto’ ou para ‘o feio não é roubar, é ser pego’”, brincou.
Opinião
Ao falar sobre jornalismo, o comentarista não poupou críticas à falta de espaço para a opinião nos telejornais, principalmente em sua “ex-casa”. “O SBT extinguiu a opinião e isso é um crime que eu gostaria de denunciar para vocês aqui hoje. Justamente o SBT, que foi um dos pioneiros da opinião na televisão”. O jornalista foi demitido no início de 2014, junto com outros comentaristas como Denise Campos de Toledo e Carlos Chagas.
O palestrante também repudiou a censura à Rachel Sheherazade, também do SBT. Apesar de considerar que a colega errou em seus comentários – nos quais é acusada de estimular a violência, por exemplo –, condenou a mordaça instituída pela emissora.
Barbárie em nosso quintal
“O tema fundamental do século XXI é a ética a serviço da cidadania”, afirmou. Para demonstrar que este assunto ainda precisa evoluir muito na atual sociedade, voltou a comentar sobre barbáries atuais, como o sequestro de estudantes na Nigéria por extremistas mulçumanos.
Nêumanne, no entanto, alertou que o problema não está apenas em outros países e nem tão longe quanto muitos pensam. Relatou que sua esposa é professora na periferia de João Pessoa (PB) e que um de seus alunos sumiu da escola por algum tempo, se escondendo dos traficantes locais, segundo relatos. Quando o estudante reapareceu, havia tido suas mãos deformadas pelos criminosos.
O ético é a favor da vida
O jornalista também abordou o caso do linchamento de uma mulher no Guarujá. “É um ato de barbárie totalmente incompreensível. Um ato terrorista”, recriminou. Contou, ainda, que está acontecendo algo ainda pior: os traficantes da região estão assassinando os agressores, porque o caso atraiu a polícia para a região e está atrapalhando os negócios.
Isto, segundo Nêumanne, é uma combinação terrível de Lei de Talião – “olho por olho, dente por dente” – e do primado do negócio sobre o indivíduo, no qual o traficante, que já pratica uma atividade ilegal, considera suas vendas mais importantes que a vida dos demais. “É muito fácil identificar o que é ético ou não. O que é ético é a favor da vida. O que não é ético é a favor da morte”, definiu.
Antes de abrir espaço para as perguntas da plateia, comentou também sobre a falta de ética no cotidiano do cidadão comum, como o suborno a um guarda de trânsito, por exemplo, e de como isso influencia na sociedade. “Hoje, só temos condições de viver se colocarmos a vida em primeiro lugar. Não só a nossa, mas a do outro também”.
Perguntas
Questionado sobre a atuação ética e a relação entre o interesse do público e a privacidade no fazer jornalístico, o palestrante afirmou que considera que pessoas públicas escolhem ter sua vida devassada, exceto por alguns momentos de privacidade, e que enxerga com naturalidade quando a imprensa aborda temas sobre a vida particular destas pessoas.
Sobre a dificuldade de se trabalhar a ética na educação, tema levantado pela professora Hânia Pilan, falou que é uma missão quase impossível ser professor no Brasil. “Ao longo da minha carreira, aprendi que o maior problema do Brasil é a educação, do primário ao ministro. É um desafio muito complicado.”
“Hoje, a escola é o lugar onde se ‘desalfabetiza’ o aluno. Quem aprendeu alguma coisa em casa, desaprende na escola, principalmente na pública. Isto é muito triste”, lamentou. Após criticar as atuações dos governos PT e PSDB em relação à educação, respondeu à professora: “Não tenho nenhuma palavra consoladora para lhe dar”.
Perguntado por uma aluna sobre quais seriam os benefícios da Copa do Mundo para o país, Nêumanne rebateu prontamente: “Nada!”. A reação foi recebida com muitos aplausos pela plateia. Depois, falou que errou sua previsão sobre a Copa, pois conseguiram roubar ainda mais do que ele poderia imaginar e não haverá legado nenhum. “Sou Flamengo e ia muito ao Maracanã. Me sinto duplamente lesado: por terem derrubado o Maracanã e por terem gastado 1,3 bilhões para construir uma arena. É um estádio de b*”, reclamou.
Para encerrar, falou um pouco mais sobre a classe política brasileira, mas lembrou que os cidadãos também devem atuar eticamente para ajudar a melhorar a situação do país. “Não tem nenhum fdp ladrão lá que não foi colocado por nós”, frisou. “O Brasil somos todos nós!”