Invasão da Ucrânia é suja e cruel

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José Nêumanne Pinto
Obstáculo à blitzkrieg hitlerista de Putin no vizinho mais fraco deve-se ao desconhecimento de que este é um país independente, cujo povo não aceita submeter-se ao invasor com mais força militar

O ex-agente do serviço de espionagem soviético KGB Vladimir Putin tenta justificar sua brutal, nojenta e criminosa invasão militar da Ucrânia à libertação de uma população eslava, como a russa, de um regime “nazistoide”. Quando o falso titã usou a falácia, baseou-se em informações, colhidas no território a ser anexado, de que o atual chefe de seu governo, Volodymir Zelensky, tinha limitado apoio político (40% de aprovação popular antes da escalada invasora). E que a origem étnica igual à própria justificaria a manutenção de uma ancestral ocupação pelo gigante ao lado desde os tempos dos czares Romanov até o jugo à ditadura comunista de Stalin e seus sucessores. A transformação das cidades atacadas em cenários inusitados na Europa há 75 anos, tal como a concebia o bispo de Hipona, Agostinho desde o século 4 D. C., contudo, não ajudará ao êxito final da empreitada imperialista do atual czar secreto. E já deu tempo suficiente para demonstrar seus mortíferos enganos: a última sondagem de opinião pública revelou incríveis 94% de popularidade do presidente legítimo e a lembrança da servidão à “madrasta” russa não é nada sedutora.
No Dois Dedos de Prosa no canal José Nêumanne Pinto no YouTube, o criminalista e psicólogo mineiro, descendente de poloneses expulsos da Pátria por invasões nazista e comunista, Jacó Pinheiro Goldberg, lembra o alerta de um estadista importante sobre a repetição de guerras como negócios. “Nas assembléias parlamentares, devemos ter cuidado com o crescimento da influência, tanto clara quanto oculta, do complexo militar-industrial. Há um risco de que cresça desastrosamente o poder nas mãos de pessoas erradas, e esse risco continuará a existir no futuro. Não devemos permitir que o peso dessa mistura de poderes ponha em perigo nossas liberdades ou os processos democráticos.”
Esse aviso foi dado em 17 de janeiro de 1961, não pelo cubano Fidel Castro, que acabara de completar seu primeiro ano de ditadura nos calcanhares da indústria denunciada. Nem por Nikita Kruchev, poderosíssimo chefão da ditadura comunista na denominada União Soviética, nos preliminares da crise dos mísseis em Cuba, do assassinato de Kennedy e da queda do “secretário-geral, que passava férias na Crimeia, à época território da República da Ucrânia, um dos satélites da dita União Soviética. A denúncia contra os “senhores da guerra”, execrados por Bob Dylan em célebre canção de protesto que fez sucesso nos anos 1960, teria como patrono um ex-comandante das forças libertadoras da Europa do jugo nazista na Segunda Guerra Mundial e que se tornaria presidente civil dos Estados Unidos da América nos anos 1950, Dwight (Ike) Eisenhower.
A invasão da Ucrânia também inspirou Edilson Martins, primeiro jornalista especializado em ecologia, assunto de sua coluna no Pasquim, símbolo da imprensa alternativa e desbocada contra a ditadura militar após o golpe de 1964. Em post no Facebook, intitulado Às Armas, ele escreveu: “O envio de armas para a Ucrânia, a fim de fazer frente à máquina de guerra russa, não leva essas nações a mergulharem em depressão. As guerras acontecem em nome do espaço vital, da soberania dos povos, em nome de Deus. Grandes canalhas os senhores das armas.”
Heraldo Palmeira e James Rubio Jr mandaram-me artigo revelador publicado no jornal britânico The Guardian, Por que Vladimir Putin já perdeu essa guerra, o israelense Yuval Noah Harari, historiador e autor do best-seller Sapiens: Uma Breve História da Humanidade”, escreveu: “Infelizmente, essa guerra provavelmente será duradoura. Tomando diferentes formas, pode muito bem continuar por anos. Mas a questão mais importante já foi decidida. Os últimos dias provaram ao mundo inteiro que a Ucrânia é uma nação muito real, que os ucranianos são um povo muito real e que definitivamente não querem viver sob um novo império russo. A principal questão deixada em aberto é quanto tempo levará para que essa mensagem penetre nas grossas paredes do Kremlin.”
Nas pedras dos muros ainda ameaçadores (mercê do enorme arsenal nuclear) do Kremlin não se jogam mais anões, tal qual nos tempos dos czares, como é narrado no clássico Os Romanov, de Simon Montefiore. Mas ali atua um imitador de Pedro, o Grande, Stalin e Hitler, que assassina civis vizinhos, inclusive crianças, para manter títeres no poder além de suas fronteiras. Putin é rejeitado em quase todos os países que importam no concerto universal. Por enquanto, esses países lhe impuseram um sufoco econômico causado por bloqueios de capitais e negócios do império “fascicapitalista”, que volta a exibir suas garras. Mas a capital mundial do crime ainda mantém incólumes seus negócios sórdidos, como expôs em artigo no Estadão o desembargador Fausto de Sanctis. Vale a pena registrar essa lembrança útil. “Deve-se contabilizar a corrupção e o desvio ético ao se planejar sanções econômico-financeiras e atacar adequadamente as contas secretas, a utilização de laranjas em favor de beneficiários finais e banir os negócios de empresas que burlem sanções desprezando a política de conformidade universalmente aceita e indispensável ao adequado patrimônio ético organizacional”, escreveu o magistrado.
A adesão do isolado aliado chinês ao mais breve cessar-fogo pode antecipar o alívio do fim dos bombardeios na Ucrânia livre, apesar de ocupada. E ainda está na hora de aproveitar essa união por sanções pesadas para nelas incluir a revelação ao mundo dos lucros ocultos de um negócio tão mortífero quanto o complexo denunciado por Eisenhower: a corrupção desenfreada dos bandidões da má gestão pública e do crime organizado.
*Jornalista, poeta e escritor

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